quinta-feira, 16 de outubro de 2014

MALALA YOUSAFZAI: UMA MENINA QUE QUERIA APENAS ESTUDAR


QUANDO MEU NETO JOÃO MIGUEL, DE 4 ANOS OUVIU NA TV O ANUNCIO DO NOBEL, ELE SE APROXIMOU E FICOU OLHANDO ATENTAMENTE. DIAS DEPOIS ELE ME CHAMOU E DISSE: VÓ, UMA CRIANÇA, UMA PROFESSORA, UMA CANETA E UM LIVRO PODEM MUDAR O MUNDO". DISSE SORRINDO PORQUE NAQUELE MOMENTO AQUELA FRASE ESTAVA FERVILHANDO NA CABECINHA DELE. EU OLHEI PRÁ ELE SEM DIZER NADA E DEI-LHE O MELHOR ABRAÇO QUE PUDE. FOI LINDO E O SORRISO DELE FOI MAIOR AINDA. DE VEZ EM QUANDO ELE REPETE. QUE FRASE! UMA SEMENTE FOI LANÇADA NAQUELA CABECINHA E ESPERO QUE FRUTIFIQUE.

Fatima Oliveira *


Com a sua campanha, ela ganhou a simpatia do mundo

Paquistanesa de Mingora, no vale do Swat, Malala Yousafzai, 16, sobreviveu a um atentado dos talebans: um tiro na cabeça quando voltava de ônibus da escola, em 9 de outubro de 2012, sob alegação de “promover a cultura ocidental em áreas pashtuns”. Através de sua campanha em prol do direito à educação das meninas e contra o fundamentalismo religioso, ela ganhou a simpatia do mundo.

Não sem razão. “32 milhões de meninas estão fora da escola no mundo por três motivos: a percepção cultural sobre o papel que têm que cumprir na família, o custo da sua educação e a segurança no caminho do colégio, ou dentro da própria escola. Só no Paquistão, 3,2 milhões de garotas estão fora das escolas” (dados da KidsRights).

Malala foi levada de helicóptero para um hospital militar em Peshawar, capital do Paquistão. Após os primeiros atendimentos, foi transferida para Londres, onde finalizou seu tratamento. Jurada de morte no Paquistão, vive com sua família em Birmingham, Inglaterra. Mas Shahidullah Shahid, porta-voz do Taleban paquistanês, não se cansa de dizer: “Os talebans tomarão Malala como alvo tanto se estiver nos Estados Unidos quanto no Reino Unido”. Hoje ela é uma bem-articulada e desenvolta ativista internacional pelo direito à educação das meninas e contra o fundamentalismo religioso.

Meninas estão fora
da escola no mundo,
por três motivos: o
papel que têm que
cumprir na família, o
custo de sua educação
e a segurança na escola

Em 2012, recebeu o Prêmio Internacional da Paz das Crianças, em Haia, premiação da organização humanitária KidsRights; criou o Fundo Malala com a doação de US$ 200 milhões feita pelo Banco Mundial para apoiar a educação das meninas no mundo; no último dia 10 de outubro, foi a mais jovem agraciada com o Prêmio Sakharov de Liberdade de Expressão do Parlamento Europeu, mais importante prêmio de direitos humanos da União Europeia, além de ter sido a pessoa mais jovem do mundo indicada ao Prêmio Nobel da Paz 2013, que foi concedido à Organização para a Proibição das Armas Químicas (Opaq).

Malala é filha de um professor paquistanês, Ziauddin Yousafzai, que cedo descobriu o gosto da filha pelos estudos e preceptora em áreas como literatura e humanidades desde bem criança. Ele era dono de uma escola mista que foi fechada em 2010 quando o vale do Swat foi ocupado pelo Taleban.

O ex-diretor do site da BBC no Paquistão Mirza Waheed declarou: “Ela é apenas uma menina que queria ir para a escola”. Em 2009, após a proibição da televisão, da música e da educação para meninas, Mirza Waheed acatou a sugestão de um repórter, Abdul Hai Kakkar, para que algum professor da escola de Ziauddin Yousafzai escrevesse sobre a vida no vale do Swat sob o regime do Taleban, porém os professores, com medo, não aceitaram. Malala Yousafzai, na época com11 anos, aluna da sétima série, demonstrou interesse. E assim foi publicado “O Diário Escolar de uma Menina do Paquistão”, escrito por Malala Yousafzai, com o pseudônimo de Gul Makki.

Em seu livro “Eu sou Malala”, escrito com a jornalista Christina Lamb (Companhia das Letras), que ainda não li, no prólogo “O dia em que meu mundo mudou”, ela diz: “Venho de um país criado à meia-noite. Quando quase morri era meio-dia.

Há um ano saí de casa para ir à escola e nunca mais voltei. Levei um tiro de um dos homens do Taleban e mergulhei no inconsciente do Paquistão. Algumas pessoas dizem que não porei mais os pés em meu país, mas acredito firmemente que retornarei. Ser arrancada de uma nação que se ama é algo que não se deseja a ninguém”.

Malaia desejava ser médica, agora quer ser primeira-ministra do Paquistão.





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* Médica e escritora. É do Conselho Diretor da Comissão de Cidadania e Reprodução e do Conselho da Rede de Saúde das Mulheres Latino-americanas e do Caribe. Indicada ao Prêmio Nobel da paz 2005.

"O PROPÓSITO É COMO SEREMOS MORALMENTE RESPONSÁVEIS E EM NOSSO TEMPOI DE VIDA, VER O FIM DO TRABALHO INFANTIL" KAILASH SATYARTHI



Créditos: Yuri Kiddo

por Arturo Hartmann, do Promenino com Cidade Escola Aprendiz
Enviado especial a Brasília


O ativista Kailash Satyarthi era um dos mais requisitados para reuniões e conversas. Esta entrevista exclusiva que concedeu ao Promenino foi interrompida pelo pedido de seu assessor, pois ele devia correr para uma reunião de última hora com uma autoridade da Coreia do Sul. O indiano, militante contra o trabalho infantil desde os anos 80, falou sobre o atual estágio da erradicação, do que devemos fazer para acelerar o passo e da responsabilidade moral que recai sobre a comunidade internacional.

Lei mais sobre a Conferência:
Plenária debate urgências para que metas de erradicação sejam cumpridas

Promenino: Algumas discussões da Conferência, e você disse isso no primeiro dia, mostram preocupação de que não iremos cumprir as metas de 2016, de erradicação das piores formas. Devemos rever as metas ou encontrar formas de acelerar as políticas de combate?
Kailash Satyarthi: Acho que devemos fazer um momento de instrospecção e usar nossos sucessos até agora para multiplicá-los em outros lugares. Temos que fazer isso imediatamente. Se continuarmos no passo presente, não permaneceremos no caminho. Mas se pudermos fazer esforços regionais, podemos alcançar as duas metas (a de erradicação de piores formas em 2016 e de todo o trabalho infantil até 2020). Em um espaço de três anos muitas coisas mudam. Depois de dois anos, você imaginaria as mudanças que vimos nos países árabes. O que aconteceu no Egito, na Síria, no Iêmen. As coisas mudaram porque as pessoas queriam que mudassem. O que esta Conferência pode aprender é que se você estiver comprometido, se for honesto, se tiver uma estratégia, então pode alcançar o objetivo. Eu não sou pessimista se um esforço genuíno for feito.

Promeino: Quais políticas estão sendo bem-sucedidas?
Kailash Satyarthi: Vemos em vários países que muitos desenvolvimentos estão sendo expandidos em educação, incluindo na Índia. Ou em países pobres, como Bangladesh. Se as crianças estão indo à escola e lá há incentivos e uma boa educação, elas permanecem na escola. Outra coisa que funcionou na Índia foi o esquema de garantia de emprego nas zonas rurais, um programa de proteção social que ajudou milhões de pessoas e retirou crianças do trabalho infantil e colocou-as na escola. Em países onde a educação foi tornada grátis e mais útil, como na Tanzânia ou no Quênia, as crianças estão indo à escola em vez de irem a minas, fábricas e fazendas. Isso funcionou.

Outra questão é a pressão do consumidor. Por exemplo, a indústria do carpete, no sul da Ásia. Quando comecei a lutar contra ela, no começo dos anos 90, o número de crianças que trabalhavam neste setor era de um milhão, fazendo carpetes que eram vendidos para todo o mundo. Lançamos uma campanha na Europa e nos Estados Unidos, e isso pressionou as grandes companhias e os fornecedores locais a acharem uma saída. A demanda então cresceu para carpetes livres de trabalho infantil. Tivemos que introduzir um novo sistema de identificação para os consumidores, que começaram a comprar carpetes sem trabalho de criançasl. O resultado foi que, do meio dos anos 90 até hoje, o número caiu de um milhão para 300 mil, ou seja, 700 mil crianças foram tiradas do trabalho infantil e estão, muito provavelmente, na escola.

Promenino: Você disse algo interessante no primeiro dia, sobre a emergência ética, o fato de que temos que ter uma ética, pois essas crianças que trabalham não poderão nos cobrar responsabilidade.
Kailash Satyarthi: Falamos de crianças neste hotel caro e muito bonito, um lindo ambiente, boa comida, um lugar luxuoso para viver, além de viajarmos por todo o mundo. Mas a todo o momento devemos pensar que temos que ser cobrados por nossa responsabilidade em relação às crianças cujos problemas, dores e sofrimento estamos representando aqui, e isso é uma questão moral. E se não nos cobrarmos responsabilidade a nós mesmos, então por que estamos aqui? Não estamos aqui para nos mostrar a nossos doadores ou fazer boas reportagens e ficarmos felizes, ou mostrarmos nossas faces na câmera. Isso é bobagem, o propósito é como seremos moralmente responsáveis em relação a essas crianças e, em nosso tempo de vida, ver o fim do trabalho infantil.

Promenino: Hoje enfrentamos algumas crises, como a questão na Síria. Ou ainda tivemos a crise econômica de 2008. A comunidade internacional criou mecanismos para que esses momentos não façam retroceder as conquistas de erradicação do trabalho infantil?
Kailash Satyarthi: Isso é verdade, sobre crises econômicas ou ecológicas, devido a mudanças climáticas. Ou então insurgências ou guerras entre países. Estas coisas atingem os pobres dos pobres, e quem são os mais vulneráveis, os mais miseráveis, os últimos membros de uma sociedade? São as crianças de uma família pobre, de um trabalhador pobre de uma vila, em qualquer parte do mundo. Enquanto não vermos o mundo por meio do olhar desta última pessoa do mundo, não conseguiremos uma mudança rápida e positiva. Então temos que ter em conta que, quando lidamos com uma crise, nossos gastos na erradicação do trabalho infantil ou em educação não podem diminuir. Não podemos ter cortes de governos ou de nossos doadores. Investir em crianças é investir no presente e também no futuro.

Assista à entrevista completa no canal de YouTube do Promenino:

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

MORAR EM PAÍS MENOS CONSERVADOR FAZ BEM À SAÚDE (VOU PRÁ LÁ)

Andres Stapff/Reuters







Mujica: segundo a Economist, reformas feitas no Uruguai fariam do mundo um lugar melhor



São Paulo - Alô, eleitor, a ciência adverte: viver num país conservador pode fazer mal para a suasaúde.


O aviso vem de um estudo americano. Por lá, os felizes cidadãos que vivem em estados administrados por governos liberais (equivalente aos de esquerda daqui), que priorizam os direitos sociais e se abrem para temas polêmicos, como legalização da maconha, aborto e casamento gay, levam uma vida mais saudável.


É que nesses lugares, os programas sociais têm mais força e as comunidades mais pobres e isoladas recebem mais apoio.


Mas até os mais ricos, que não precisam dessa ajuda, sentem os benefícios: aqueles que vivem em cidades liberais têm hábitos mais saudáveis (bebem e fumam menos e se exercitam mais).


Dá pra entender o motivo das bebedeiras entre os cidadãos governados por conservadores…


Os pesquisadores chegaram a essa conclusão depois de combinar os dados de três estudos diferentes: uma delas avaliava a saúde dos participantes (Behavioral Risk Factor Surveillance System), outra media os níveis de confiança social (Gallup Healthways Survey), e a última checava as taxas de liberalismo e conservadorismo nos estados americanos.


No total, mais de 450 mil pessoas foram incluídas na pesquisa.


É, pelo jeito a vida por aqui deve ficar mais difícil nos próximos quatro anos – o Congresso recém-eleito é o mais conservador desde 1964.


Mas, ok, há uma saída: morar perto de vizinhos bacanas. Quando os participantes viviam próximos de pessoas honestas e prestativas, os hábitos saudáveis também cresciam.


“Fatores sociais têm influência. Pode ser que os programas do governo ou o ‘capital social’ (ter o apoio de quem nos rodeia) influencie nossa saúde”, confirma Ed Diener, um dos autores da pesquisa.


Viu só que responsabilidade tem seu voto?


(Na foto, o presidente do Uruguai, Pepe Mujica. Segundo a Economist, as reformas feitas no Uruguai fariam do mundo um lugar melhor.)






Mujica te convida a morar no Uruguai

Mujica quer que cidadãos do Mercosul possam ter residência permanente no Uruguai. Texto, enviado pelo presidente uruguaio ao parlamento do país, precisa ser aprovado por deputados e senadores

Pelo projeto de lei enviado por Mujica ao Parlamento, residência permanente passa a ser automática

O presidente uruguaio José Mujica enviou nesta terça-feira (29/01) ao Parlamento uruguaio um projeto de lei que concede residência permanente a todos aqueles cidadãos dos países do Mercosul com a única exigência de confirmar a nacionalidade. O texto precisa ser votado por deputados e senadores para entrar em vigor.

O projeto de lei também facilita a residência permanente no Uruguai a “cônjuges, concubinos, pais, irmãos e netos” de uruguaios, para facilitar a entrada de famílias com diferentes nacionalidades retornando ao país.

Essas mudanças na legislação migratória obedecem à nova política nacional de vinculação e retorno dos uruguaios estabelecidos no exterior. Na justificativa do projeto de lei, Mujica diz que ele também se alinha ao espírito do Acordo de Residência do Mercosul, assinado em 2002 em Brasília.

Atualmente, para um nacional do Mercosul estabelecer residência no Uruguai, deve passar, primeiro, por um período de dois anos de residência temporária. Somente após esse período, pode solicitar a residência permanente. O processo ainda inclui, entre outros requisitos, a apresentação de um carnê de saúde, antecedentes penais e certidão de nascimento.

Segundo o projeto de lei, a finalidade da norma proposta “se origina na vocação integracionista do país, tanto em relação aos nacionais que residem no exterior e retornam, como em relação aos nacionais dos Estados Partes do Mercosul e Estados Associados”.
Argentinos e brasileiros

Há poucos dias, o jornal uruguaio El País informou que o número total de residências outorgadas apresentou um aumento considerável no último ano. Enquanto que, em 2012, foram concedidas 2.426, em 2013 foram 5.885, o que se traduz em um crescimento maior ao que se produziu logo após a aplicação da Lei de Migração de 2008.

O número de pedidos é liderado pelos argentinos, que, em 2013, tiveram 1.645 permissões definitivas outorgadas, contra 461 em 2012. O número de brasileiros radicados no Uruguai também apresentou um aumento em 2013, com 634 novas residências, contra 305 em 2012.

Rafael Reis, Opera Mundi

PARA CHICO CÉSAR, PRECONCEITO VEM DE QUEM PERDEU PRIVILÉGIOS

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Bruno Garcez
Manifestações de preconceito como as expressas em redes sociais após a apuração de votos no primeiro turno das eleições, que deram uma ampla vantagem à candidata do PT Dilma Rousseff nas regiões Norte e Nordeste, vêm de “gente assustada por ter de dividir o elevador social com quem antes ia pelo elevador de serviço”.
A opinião é do cantor e compositor paraibano Chico César, um dos entrevistados pelo #salasocial – o projeto da BBC Brasil que traz à tona temas de repercussão nas redes sociais.
“Claro que há esse tipo de visão ainda, mas ela depõe mais contra quem a expressa do que contra os nordestinos ou nortistas. Trata-se de gente que perdeu privilégios ou que se sente insegura nem por ter perdido, mas por perceber que o outro que se encontrava abaixo dele na possibilidade de acesso aos bens e serviços agora não está mais. Encontra-se mais próximo, ou no mesmo patamar. É gente assustada por ter de dividir o elevador social com quem antes ia pelo elevador de serviço”, disse o músico.
“Há muita gente magoada por ter de pagar direitos trabalhistas a empregadas domésticas, por viajar de avião ao lado de gente que antes levava três, quatro dias para atravessar o país de ônibus, pelo fato de o filho do vigia de sua rua ou do zelador do prédio estudar na universidade, pois ele sabe que este rapaz ou moça não ocupará mais cargos de subemprego. Acho que temos de responder sempre ao preconceito. A qualquer preconceito, que às vezes também temos e nem percebemos.
Chico César, no entanto, não concorda com a atitude de alguns internautas que, supostamente para “dar o troco”, passaram a atacar paulistas via redes sociais.
“São Paulo não combina com generalizações. Elegeu prefeita a paraibana Luiza Erundina. Um pouco depois, o negro e carioca Pitta. É terra de punks e skinheads, de programa de auditório e poesia concreta, de uma das maiores paradas gays do mundo”, disse.
Para o cantor casos isolados de preconceito não devem ser generalizados.
“Há um pensamento conservador de destruição e esvaziamento da política com “P” maiúsculo que quer nos levar a pensar assim, a traduzir manifestações isoladas como tradução do todo. Esse pensamento conservador e desmotivador da grande política, esse sim, tem-se alastrado com o vasto apoio da mídia corporativa brasileira.”


Fonte: BBC

terça-feira, 7 de outubro de 2014

CHIMAMANDA ADICHIE: "SEJAMOS TODOS FEMINISTAS"

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Toda vez que os garçons me ignoram, me sinto invisível. Fico chateada. Quero dizer a eles que sou tão humana quanto um homem – e digna de ser cumprimentada



CHIMAMANDA ADICHIE

“Sejamos todos feministas”

Okoloma era um de meus melhores amigos de infância. Morávamos na mesma rua, e ele cuidava de mim como um irmão mais velho. Quando eu gostava de um garoto, pedia a opinião dele. Engraçado e inteligente, usava uma bota de caubói de bico pontudo. Em dezembro de 2005, ele morreu num acidente de avião, no sudoeste da Nigéria. Até hoje não sei expressar o que senti. Era uma pessoa com quem eu podia discutir, rir e ter conversas sinceras. Também foi o primeiro a me chamar de feminista.
Eu tinha 14 anos. Um dia, na casa dele, discutíamos – metralhávamos opiniões imaturas sobre livros que havíamos lido. Não lembro exatamente o teor da conversa. Mas estava no meio de uma argumentação quando Okoloma olhou para mim e disse: “Sabe de uma coisa? Você é feminista!”. Não era um elogio. Percebi pelo tom da voz dele – era como se dissesse: “Você apoia o terrorismo!”. Não sabia o que a palavra feminista significava. E não queria que Okoloma soubesse que não sabia. Então disfarcei e continuei argumentando. A primeira coisa que faria ao chegar em casa seria procurar a palavra no dicionário.
Em 2003, escrevi um romance chamado Hibisco roxo, sobre um homem que, entre outras coisas, batia na mulher, e sua história não acaba lá muito bem. Enquanto eu divulgava o livro na Nigéria, um jornalista, um homem bem-intencionado, veio me dar um conselho (talvez vocês saibam que nigerianos estão sempre prontos a dar conselhos que ninguém pediu). Ele comentou que diziam que meu livro era feminista. Seu conselho – disse, balançando a cabeça com um ar consternado – era que eu nunca, nunca me intitulasse feminista, já que as feministas são mulheres infelizes que não conseguem arranjar marido. Então decidi me definir como “feminista feliz”.
Mais tarde, uma professora universitária nigeriana veio me dizer que o feminismo não fazia parte de nossa cultura, que era antiafricano e que, se eu me considerava feminista, era porque fora corrompida pelos livros ocidentais. De qualquer forma, já que o feminismo era antiafricano, resolvi me considerar “feminista feliz e africana”. Depois, uma grande amiga me disse que, se eu era feminista, então devia odiar os homens. Decidi me tornar uma “feminista feliz e africana que não odeia homens – e que gosta de usar batom e salto alto para si mesma, não para os homens”.
É claro que não estou falando sério, só queria ilustrar como a palavra “feminista” tem um peso negativo. A feminista odeia os homens, odeia sutiã, odeia a cultura africana, acha que as mulheres devem mandar nos homens; ela não se pinta, não se depila, está sempre zangada, não tem senso de humor, não usa desodorante.
Quando eu estava no primário, no começo do ano letivo a professora anunciou que daria uma prova, e quem tirasse a nota mais alta seria o monitor da classe. Ser monitor era muito importante. Queria muito ser a monitora da minha classe. E tirei a nota mais alta. Mas, para minha surpresa, a professora disse que o monitor seria um menino. Ela se esquecera de esclarecer esse ponto, achou que fosse óbvio. Um garoto tirou a segunda nota mais alta. Ele seria o monitor. O mais interessante é que o menino era uma alma bondosa e doce, que não tinha o menor interesse em vigiar a classe com uma vara – exatamente o que eu almejava. Mas eu era menina, e ele menino, e ele foi escolhido. Nunca me esqueci desse episódio.
Se repetimos uma coisa várias vezes, ela se torna normal. Se vemos uma coisa com frequência, ela se torna normal. Se só os meninos são escolhidos como monitores da classe, então em algum momento nós todos acharemos, mesmo que inconscientemente, que só um menino pode ser o monitor da classe. Se só os homens ocupam cargos de chefia nas empresas, começamos a achar “normal” que esses cargos de chefia só sejam ocupados por homens.
Homens e mulheres são diferentes. Temos hormônios diferentes, órgãos sexuais diferentes e atributos biológicos diferentes – as mulheres podem ter filhos, os homens não. Os homens têm mais testosterona e, em geral, são fisicamente mais fortes que as mulheres. Existem mais mulheres do que homens no mundo – 52% da população mundial é feminina. Mas os cargos de poder e prestígio são ocupados pelos homens. A nigeriana Wangari Maathai, ganhadora do Prêmio Nobel da Paz, se expressou muito bem e em poucas palavras quando disse que, quanto mais perto do topo chegamos, menos mulheres encontramos.
Então, de uma forma literal, os homens governam o mundo. Isso fazia sentido há 1.000 anos. Os seres humanos viviam num mundo onde a força física era o atributo mais importante para a sobrevivência. Quanto mais forte alguém era, mais chances tinha de liderar. E os homens, de uma maneira geral, são fisicamente mais fortes. Hoje, vivemos num mundo completamente diferente. A pessoa mais qualificada para liderar não é a fisicamente mais forte. É a mais inteligente, a mais culta, a mais criativa, a mais inovadora. E não existem hormônios para esses atributos. Tanto um homem como uma mulher podem ser inteligentes, inovadores, criativos. Nós evoluímos. Mas nossas ideias de gênero ainda deixam a desejar.
Sempre que vou acompanhada a um restaurante nigeriano, o garçom cumprimenta o homem e me ignora. Os garçons são produto de uma sociedade em que se aprende que os homens são mais importantes que as mulheres. Sei que eles não fazem por mal – mas há um abismo entre entender algo racionalmente e entender emocionalmente. Toda vez que eles me ignoram, me sinto invisível. Fico chateada. Quero dizer a eles que sou tão humana quanto um homem e digna de ser cumprimentada. Sei que são detalhes, mas às vezes são os detalhes que mais incomodam. Uma amiga americana trabalha com publicidade e tem um belo salário. Só há duas mulheres em sua equipe: ela e uma outra. Certa vez, numa reunião, ela disse que se sentira menosprezada por sua chefe, que ignorara seus comentários e elogiara um dos homens que haviam emitido uma opinião parecida com a dela. Ela queria se colocar e enfrentar a chefe, mas ficou quieta. Depois da reunião, foi chorar no banheiro e me ligou para desabafar.  Ela não disse o que pensava para não parecer agressiva. Deixou o ressentimento ferver em banho-maria. O que me impressionou – em relação a ela e a várias outras amigas americanas – é quanto essas mulheres investem em ser “queridas”, como foram criadas para acreditar que ser benquista é muito importante. Isso não inclui demonstrar raiva ou ser agressiva, tampouco discordar.
Perdemos muito tempo ensinando as meninas a se preocupar com o que os meninos pensam delas. Mas o oposto não acontece. Não ensinamos os meninos a se preocupar em ser “benquistos”. Se perdemos muito tempo dizendo às meninas que elas não podem sentir raiva ou ser agressivas ou duras, elogiamos ou perdoamos os homens pelas mesmas razões. Em todos os lugares do mundo, existem milhares de artigos e livros ensinando o que as mulheres devem fazer, como devem ou não devem ser para atrair e agradar aos homens. Livros sobre como os homens devem agradar às mulheres são poucos.
Criamos as meninas de uma maneira bastante perniciosa, porque as ensinamos a cuidar do ego frágil masculino
A questão de gênero é importante em qualquer canto do mundo. É importante que se comece a planejar e a sonhar um mundo diferente. Um mundo mais justo. Um mundo de homens mais felizes e mulheres mais felizes, mais autênticos com si próprios. É assim que devemos começar: precisamos criar nossas filhas de uma maneira diferente. Também precisamos criar nossos filhos de um outro modo. O modo como criamos nossos filhos homens é nocivo. Nossa definição de masculinidade é muito estreita. Abafamos a humanidade que existe nos meninos, enclausuramo-los numa jaula pequena e resistente. Ensinamos que eles não podem ter medo, não podem ser fracos ou se mostrar vulneráveis, precisam esconder quem realmente são – porque têm de ser, como se diz na Nigéria, homens duros.
livro hibisco Chimamanda Adichie: Sejamos todos feministas
HIBISCO ROXO Em seu primeiro romance, Chimamanda conta a história de uma família nigeriana oprimida pelo catolicismo fanático do pai
No ensino médio, quando um garoto e uma garota saem juntos, o único dinheiro de que dispõem é uma pequena mesada. Mesmo assim, espera-se que ele pague a conta, sempre, para provar sua masculinidade. (Depois nos perguntamos por que alguns roubam dinheiro dos pais…) E se tanto os meninos quanto as meninas fossem criados a não mais vincular a masculinidade ao dinheiro? O pior é que, quando os pressionamos a agir como durões, os deixamos com o ego muito frágil. Quanto mais duro um homem acha que deve ser, mais fraco será seu ego. E criamos as meninas de uma maneira bastante perniciosa, porque as ensinamos a cuidar do ego frágil do sexo masculino. Ensinamos as meninas a se encolher, a se diminuir, ao lhes dizer: “Você pode ter ambição, mas não muita. Deve almejar o sucesso, mas não muito. Senão você ameaça o homem. Se você é a provedora da família, finja que não é, sobretudo em público. Senão você emasculará o homem”. Por que, então, não questionar essa premissa? Por que o sucesso da mulher ameaça o homem?
Uma vez, um conhecido meu nigeriano me perguntou se não me incomodava que os homens se sentissem intimidados comigo. Não me preocupo nem um pouco, porque o homem que se sente intimidado por mim é exatamente o tipo de homem por quem não me interesso. Mesmo assim, fiquei surpresa. Já que pertenço ao sexo feminino, espera-
se que almeje me casar. Espera-se que faça minhas escolhas levando em conta que o casamento é o fato mais importante do mundo. O casamento pode ser algo bom, uma fonte de felicidade, amor e apoio mútuo. Por que ensinamos as meninas a aspirar ao casamento, mas não fazemos o mesmo com os meninos?
Uma nigeriana conhecida minha decidiu vender sua casa para não intimidar o homem que eventualmente quisesse se casar com ela. Conheço uma outra, também solteira, que, em congressos, usa uma aliança de casamento porque quer “ser respeitada” pelos colegas. Isso num ambiente de trabalho moderno. Há moças que, de tão pressionadas pela família, pelos amigos, até pelo trabalho, acabam fazendo péssimas escolhas. Em nossa sociedade, a mulher de uma certa idade que ainda não se casou se enxerga como uma fracassada. O homem, se ainda permance solteiro, é porque não teve tempo de fazer sua escolha.
Falar é fácil, eu sei, mas as mulheres só precisam aprender a dizer “não” a tudo isso. A realidade, porém, é mais difícil, mais complexa. Somos seres sociais e internalizamos as ideias por meio da socialização. Ensinamos que, nos relacionamentos, é a mulher quem deve abrir mão das coisas. Criamos nossas filhas para enxergar as outras como rivais – não em questões de emprego ou realização, mas rivais da atenção masculina. Ensinamos as meninas que elas não podem agir como seres sexuais do mesmo modo que os meninos. Se temos filhos homens, não nos importamos em saber sobre as namoradas. E os namorados de nossas filhas? Esperamos que elas arranjem o homem perfeito para, na hora certa, se casar. Policiamos nossas meninas. Elogiamos a virgindade delas, mas não a dos meninos (me pergunto como isso pode funcionar, já que a perda da virgindade é algo que normalmente envolve duas pessoas).
Recentemente, uma moça foi estuprada por um grupo de homens, na Nigéria. A reação de vários jovens, de ambos os sexos, foi algo do gênero: “Sim, estuprar é errado, mas o que ela estava fazendo no quarto com quatro homens?”. Bem, se possível, tentemos esquecer a crueldade desse raciocínio. Os nigerianos foram criados para achar que as mulheres são inerentemente culpadas. E elas cresceram esperando tão pouco dos homens que a ideia de vê-los como criaturas selvagens, sem autocontrole, é, de certa forma, aceitável.
Ensinamos as meninas a sentir vergonha. “Fecha as pernas, olha o decote.” Nós as fazemos sentir vergonha da condição feminina, elas já nascem culpadas. E crescem e se transformam em mulheres que não podem externar seus desejos. Elas se calam, não podem dizer o que realmente pensam, fazem do fingimento uma arte. Conheço uma mulher que odiava tarefas domésticas, mas fingia que gostava, pois fora ensinada que “uma boa esposa” tem de ser “caseira”. Ela por fim se casou. A família do marido começou a reclamar quando seu comportamento mudou. Ora, na verdade ela não mudou. Apenas se cansou de fingir ser o que não era.
Se uma humanidade inteira de mulheres não faz parte de nossa cultura, temos de mudar a cultura
O problema de gênero é prescrever como devemos ser, em vez de reconhecer como somos. Seríamos bem mais felizes, mais livres para ser quem realmente somos, se não tivéssemos o peso das expectativas do gênero.
Decidi parar de me desculpar por ser feminina. Quero ser respeitada por minha feminilidade. Porque mereço. Gosto de política e história e adoro uma conversa boa, produtiva. Sou feminina. Sou feliz por ser feminina. Gosto de salto alto e de variar os batons. É bom receber elogios, seja de homens, seja de mulheres (cá entre nós, prefiro ser elogiada por mulheres elegantes). Com frequência uso roupas que os homens não gostam ou não “entendem”. Uso essas roupas porque me sinto bem nelas. O “olhar masculino”, como determinante das escolhas da minha vida, não me interessa.
livro americanah Chimamanda Adichie: Sejamos todos feministas
AMERICANAH
Livro mais recente de Chimamanda, ele conta a história de uma blogueira feminista nigeriana que vive nos EUA
Muita gente diz que a mulher é subordinada ao homem porque isso faz parte da nossa cultura. Mas a cultura está sempre em transformação. Tenho duas sobrinhas gêmeas e lindas, de 15 anos. Se tivessem nascido há 100 anos, teriam sido assassinadas. Há 100 anos, a cultura Igbo considerava o nascimento de gêmeos como um mau presságio. Hoje, essa prática é impensável para nós.
Para que serve a cultura? A cultura funciona para preservar e dar continuidade a um povo. Em minha família, sou a filha que mais se interessa pela história de quem somos, nossas terras ancestrais, nossas tradições. Meus irmãos não têm tanto interesse. Mas não posso ter voz ativa, porque a cultura Igbo favorece os homens, e só eles podem participar das reuniões em que as decisões familiares mais importantes são tomadas. Então, apesar de ser mais ligada a esses assuntos, não posso frequentar as reuniões. Não tenho direito a voz. Porque sou mulher.
A cultura não faz as pessoas. As pessoas fazem a cultura. Se uma humanidade inteira de mulheres não faz parte de nossa cultura, então temos de mudar nossa cultura.
Penso com frequência em meu amigo Okoloma. Espero que ele e os outros que morreram na queda do avião descansem em paz. Ele sempre será lembrado por aqueles que o amavam. Tinha razão, anos atrás, ao me chamar de feminista. Sou feminista. Naquele dia, quando cheguei em casa e procurei a palavra no dicionário, foi esse o significado que encontrei: “Feminista: uma pessoa que acredita na igualdade social, política e econômica entre os sexos”.
Minha bisavó, pelas histórias que ouvi, era feminista. Fugiu da casa do sujeito com quem não queria casar e casou com o homem que escolheu. Ela resistiu, protestou, falou alto quando se viu privada de espaço e acesso por pertencer ao sexo feminino. Ela não conhecia a palavra “feminista”. Mas nem por isso não era. Mais mulheres deveriam reivindicar essa palavra. O melhor exemplo de feminista que conheço é meu irmão Kene. Ele  também é um jovem legal, bonito e muito másculo. A meu ver, feminista é o homem ou a mulher que diz: “Sim, existe um problema de gênero ainda hoje e temos de resolver, podemos fazer melhor”. Todos nós, mulheres e homens, podemos fazer melhor.
assinatura Chimamanda Adichie: Sejamos todos feministas


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LUPICÍNIO RODRIGUESM A VOA DAS DESILUSÕES AMOROSAS


No teatro, no cinema e na voz de grandes intérpretes, a música homenageia o eterno boêmio militante
por Tárik de Souza — publicado 05/10/2014 08:04
Lupicínio Rodrigues


Esculpido em bronze, Lupicinio Rodrigues terá até o fim do ano mesa cativa diante do Centro Municipal de Cultura que leva seu nome, no bairro da Ilhota, onde nasceu, como parte do projetoLupi 100 Anos de Amor e Dor da Prefeitura de Porto Alegre. Na cidade, o teatro rebobina sua trajetória em Lupi, o Musical – Uma Vida em Estado de Paixão, direção de Artur José Pinto e Mathias Behrends. No cinema, ainda não lançado,Nervos de Aço, longa ficcional, dirigido por Maurice Capovilla, inspira-se em suas composições. Uma delas, Esses Moços (pobres moços/ ah, se soubessem o que eu sei/ não amavam/ não passavam/ aquilo que já passei), condimenta a trilha do recente filme A Despedida, de Marcelo Galvão.



Sucesso a partir de outra de suas músicas, Se Acaso Você Chegasse, em 1959, a intrépida Elza Soares celebra, há meses nos palcos, o compositor de repertório sumarizado na antologia recém-lançada em CD Lupicinio Rodrigues 100 Anos. Aninham-se na seleção de Gal Costa, Moreira da Silva, Elis Regina e Dalva de Oliveira a Beth Carvalho, Elizeth Cardoso, Doris Monteiro, Ângela Maria e Cauby Peixoto, atestado da abrangência de sua lira, ancorada nos embates amorosos. “Enquanto outros compositores de música popular buscam e rebuscam a letra, Lupicinio ataca de mãos nuas, com todos os clichês da nossa língua e chega ao insólito pelo repelido, à informação nova pela redundância deslocada de seu contexto”, escreveu o poeta concretista Augusto de Campos num ensaio sobre o compositor no livro Balanço da Bossa e Outras Bossas (Editora Perspectiva, 1968). Numa reversão de expectativas sociais, o negro ex-bedel da Faculdade de Direito da UFRGS, entre 1935 e 1947, passou a ser estudado por eruditos e virou tese de historiadores no livro Melodia e Sintonia em Lupicinio Rodrigues – O Feminino, o Masculino e suas Relações, de Maria Izilda S. de Matos e Fernando A. Faria (Bertrand Brasil, 1996).


Um dos 21 filhos de Francisco Rodrigues, porteiro da Escola de Comércio, Lupicinio, enquanto estudava, era aprendiz de mecânico e menino de recados. Rebelde a tais atividades, foi alistado no Exército pelo pai aos 15 anos, com documentos falsificados. Um ano antes, escolado na boemia e na música, compôs a marchinha Carnaval para o Cordão Predileto. Em Santa Maria, em 1933, agora soldado, amargaria a primeira aguda dor de cotovelo (termo atribuído a ele) ao ser preterido pela eleita, Inah. Da rejeição teriam resultado torturadas canções como Nervos de Aço (eu só sei que quando a vejo/ me dá um desejo de morte e de dor), faixa-título do disco de Paulinho da Viola, de 1973, também acometido, décadas adiante, por abrasiva desilusão amorosa.


Ainda desconhecido, Lupicinio teria recebido elogios de Noel Rosa numa noitada, em excursão gaúcha, em 1932. Três anos depois, era premiado por Triste História, em concurso do Centenário da Revolução Farroupilha. Seu parceiro, Alcides Gonçalves, gravou o samba e fez o nome de Lupicinio estrear em disco, em 1936, com outra da dupla, Pergunte aos Meus Tamancos.





Compositor e cantor, Gonçalves rompeu a aliança quando o então Rei da Voz, Francisco Alves, gravou o estrondosoCadeira Vazia (não lhe darei carinho nem afeto/ mas pra se abrigar podes ocupar meu teto/ para se alimentar pode comer do meu pão) e seu nome foi omitido. Antes dele, coube a outro parceiro, o carioca Felisberto Martins, com bom trânsito nas gravadoras, projetá-lo no mercado da música, no raro sincopado Se Acaso Você Chegasse, na voz de um iniciante Cyro Monteiro, em 1938. Numa curta passagem pelo Rio, no ano seguinte, Lupicinio enfrentou o cipoal de vaidades da era do rádio nas mesas do mítico Café Nice. Foi admitido na confraria por Ataulfo Alves, Wilson Baptista, Ary Barroso e o referido Chico Alves, embora seu rival Orlando Silva tenha emplacado antes outro petardo do novato, Brasa (você parece uma brasa/ toda vez que eu chego em casa/ dá-se logo uma explosão).


De volta à sua trincheira, o boêmio militante, futuro sócio de bares com amigos, como outro parceiro carioca, Rubens Santos, tornou-se um caso raro de astro de brilho nacional acantonado fora do eixo Rio-São Paulo. Mas pode não passar de lenda a propagação de suas músicas a partir dos cabarés do cais de Porto Alegre, adverte o músico e pesquisador Arthur de Faria, no ensaio A Fenomenologia da Cornitude, publicado no site Sul 21. A argamassa de seu longevo êxito foi o lamaçal das paixões politicamente incorretas, esculpidas em sambas-canção em que Lupicinio tangenciou o brega com cinzel de ourives. Como Sozinha, no vozeirão laminado de Jamelão, um de seus mais farpados intérpretes, na qual descreve a traição de uma ex-favelada com o doutor, chamado a curar os seus bichos-de-pé. À cena grotesca, o acurado contista do banal, como outro Rodrigues, a quem é comparado, o teatrólogo Nelson, imprime distanciamento brechtiano (Assim me falou um pobre coitado, matuto, chorando) e arremata de trivela: se pede uma flor/ e a gente lhe dá/ ela exige uma estrela/ e se por acaso, ela não obtê-la/ se vai com o primeiro homem que lhe der.


Dramalhões de tal calibre, todos inspirados em aventuras amorosas do autor, amigos e conhecidos, teriam provocado até suicídios, após as estocadas poéticas de Vingança (tu hás de rolar como as pedras/ que rolam na estrada/ sem ter nunca um cantinho de seu pra poder descansar), na voz tonitruante de Linda Batista, em 1951. O romantismo de baixos teores da bossa nova, na década seguinte, revogou tais arroubos, a despeito de o Lupicinio intérprete, com vários discos gravados, ter sido um discípulo do minimalismo de Mário Reis.


Mas foi João Gilberto, em especial na TV Tupi, em 1971, quem o reabilitou numa releitura confidente de Quem Há de Dizer. Na toada Felicidade (o pensamento parece uma coisa à toa/ mas como é que a gente voa/ quando começa a pensar), Caetano Veloso, em 1974, encarregou-se de mostrar a face regionalista do autor de mimos pampeiros comoCevando o Amargo (com Piratini), Jardim da Saudade (chancelado pelo Rei do Baião Luiz Gonzaga), além do hino do Grêmio, regravado por torcedores contemporâneos como Vitor Ramil e Borghettinho. Há ainda guarânias, valsas e marchinhas carnavalescas, entre as 286 composições meticulosamente compiladas no Almanaque do Lupi, programado para o centenário pelo pesquisador Marcello Campos.





Intuitivo absoluto, artesão sonoro munido apenas de uma caixa de fósforos, Lupicinio teve a musicalidade avalizada por regravações de Paulo Moura, João Donato, Zé Menezes, Joel Nascimento, Bocato, Lea Freire e o Milewski Swing Quartet, do violinista polonês naturalizado brasileiro Jerry Milewski no CD duplo Lupinstrumental, de 1996. Sua poesia de veias abertas cativou roqueiros como Arnaldo Antunes (Judiaria) e Thedy Corrêa, do grupo gaúcho Nenhum de Nós, no tributo eletrônico Loopcinio (2005).


Mas ninguém mergulhou tão fundo nas obsessões do compositor quanto o vanguardista Arrigo Barnabé. Em gravação na Casa de Francisca, em São Paulo, lançada, em 2011, no DVD Caixa de Ódio – O universo de Lupicinio Rodrigues, ao lado de Paulo Braga (piano) e Sergio Espíndola (violão, baixolão), ele dramatiza 18 canções do compositor. “Por essa observação penetrante do ser humano nas situações-limite da dor amorosa, por esse humor que permeia as canções, um humor voltado para a ironia e o sarcasmo, por tudo isso, estava atravessada a vontade de cantar Lupicinio”, escreveu Arrigo no encarte. Quarenta anos após a morte do compositor gaúcho, esta ainda parece ser uma pulsão capaz de varar latitudes estéticas e temporais.

ENTRE DIREITA E ESQUERDA, CONTINUA NEGRO(A)



"Entre Direita e Esquerda, continuo negro(a)"(autora: ?).


Ivan De Oliveira com José Teodoro Costa e outras 45 pessoas


OS TEMPLÁRIOS”.
*OS n.e.g.r.o.s QUE QUEREM TROCAR A PROPRIA RAÇA POR UMA CADEIRA PARA SENTAR AO LADO DOS “HOMENS BRANCOS”.


Por Ivan de Oliveira

Salvador BA. 16 de Julho de 2014

A insurgência nacionalista brasileira nasceu para contra arrestar o golpe militar de 64, e eu só vim saber de que houve heróis insurgentes brasileiros de verdade nos anos 70, época que fui convocado para cumprir o serviço militar obrigatório. Justamente quando a repressão militar apertou o cerco contra o MNR, ALN, MR-8 e VAR Palmares e do PCBR de Carlos Marighela. Durante o período de 11 meses de serviço militar, aprendi muito pouco do que realmente passou no Brasil, porem, suficientes para odiar todos àqueles que alçaram armas contra o governo militar que destituiu João Goulart. Assim que qualquer brasileiro pensaria, fosse jovem ou idoso (a), principalmente eu, carente de informação e com somente aquele quinto ano primário.
Mas que mudança abrupta na mente do povo brasileiro! Hoje fazem campanha, votam e gostam desses “comedores de criancinhas”. “Brincadeira! Eu nunca achei que comunistas fossem capazes de comer ninguém.” Fato! Eles não comem ninguém mais expurga seus correligionários “se esse ou aquele discordar em algo dos altos chefes da cúpula,” porque são o oposto da DIREITA é claro! A DIREITA não expurga seus correligionários, ela persegue, mas não os envenena como Stalin ou Joseph Bros Tito faziam com vários dos seus correligionários.
A China de Mao Tse Tung foi assim; a viúva do reformista chinês ficou conhecida como a chefa da “Máfia de Xangai”. Ela e outros três foram expurgados do PC chinês, foram presos, logo em seguida desapareceram do cenário. “Que os românticos da ESQUERDA do século 21, não percam tempo em discordar da minha maneira de pensar”, pois quem tem dignidade repudia um Nicolas Maduro, quem chama seus opositores de “Maricon” nos seus discursos publico “ala Fidel” Será que o ditador Maduro acha que “Los maricones” estão destruindo seu país? O comando das suas Forças Armadas é aliado dos “Capos” das multinacionais de drogas e Caracas e a quarta cidade mais violenta do mundo. Tudo isso um ex condutor, ex-presidente do metro de Caracas e ex Ministro das Relações Exteriores, não aprendeu nada da sua vida polivalente. Maduro mente descaradamente, aliás, o fascismo é assim! (Por favor, leiam com atenção antes de me julgar; não sou direitista e se existisse esquerda no Brasil eu estaria todo dentro)
Eu também vivi na clandestinidade. Aos 16 anos de idade deixei minha cidade natal e me infiltrei na capital em busca de uma vida melhor. Vida essa que nunca encontrei. Buscava emprego, mas não encontrava. Certa vez entrei numa fabrica de moveis para pedir emprego quando perguntado por minha RG, eu não sabia o que era. Aos 18 fui tragado pelo serviço militar obrigatório. Alivio! Me senti como gente: A Sexta Região Militar resolve realizar uma grande manobra militar até a cidade de Ibotirama, região onde os dois últimos insurgentes Capitão Carlos Lamarca e o ex seminarista Zequinha foram abatidos pelas armas assassinas repressora das mãos manchadas de sangue do Cabo Dalmar Caribe e do Major Cerqueira quem se comparou com uma “foda” por ter matado um revolucionário.
Brasileiros de verdade, listar aqui as pessoas serias que realmente queriam ver o povo no poder, mas, foram ultimados por culpa desse sonho: Os dois irmãos do Buriti Cristalino Otoniel e Olderico, Mario Japa, Iara Iavelberg, Stuart Edgar Angel, Capitão Lamarca, o ex- Sargento Darcy Rodrigues, o ex-soldado do exercito Zanirato, Ioshitane Fujimori, entre muitos outros.
Fico pensando: O Capitão Lamarca batizou a sua organização guerrilheira com o nome de “VAR Palmares” em homenagem a Zumbi dos Palmares. Mas porque nenhuma dessas organizações recrutou negros na época? Se sempre fomos tão fáceis de dar nossos votos sem retorno algum, para essa corja de corruptos brancos que nos oprime? Porque a VPR, ALN, e o MR-8 não nos recrutaram para frentes de batalhas? Quem sabe? Poderíamos ocupar Brasília. A argentina usou nossos irmãos como “carne de canhão” nas guerras contra o Paraguai e outros foram acometidos e devorados pela febre amarela. Na época todos eles eram escravos. Depois desses genocídios ergueram um monumento com a estatua de Antonio Ruiz conhecido como “El Negro Falucho” e está la entre a avenida Santa Fe e Avenida Luis M, Campos-Buenos Aires. Quando eu transitava pela área, me acercava, para dá uma olhada na estatua do “herói negro” e me lembrava dos anos 80 das reuniões que eu participava, no cemitério de sucupira, para discutir sobre “o memorial ZUMBI”, que veio a ser erguido em Alagoas na Serra da Barriga.
De natureza maldosa, O Chile e o Uruguai também tiveram heróis negros: Eram escravos que, empurrados pela “covardia do homem branco” lutaram nas frentes de batalhas a exemplo do negro FALUCHO que lutou e morreu como Argentino, defendendo o território argentino. A historia de ZUMBI foi diferente; ele se rebelou e lutou contra o sangue frio do “homem branco” em defesa dos negros, índios e dos brancos que não apoiavam os marginais europeus invasores. Hoje no Brasil se mata negros de maneira cruel e calculada, enquanto cinicamente os brancos com suas mãos manchadas de “sangue negro” constroem Universidades com o nome de ZUMBI, para homenagear políticos brancos “amigos dos negros”; essa é a nova ordem política, que também se caracteriza no cinismo contemporâneo, com a cumplicidade de certa forma dos setores minoritários, que apoia o barbarismo contra a massa. Refiro-me exatamente aos negros que se crê superior aos que não são letrados. Capitães do Mato que ajudaram os assassinos holandeses a encontrar a base militar de ZUMBI. Aqueles Capitães do Mato de ontem, estão vivos, apoiando os brancos que não titubeiam em assinar minha sentença numa só canetada. Os Capitães do Mato de ontem estão vivinhos nos dias de hoje e se prevalecem porque são da minha raça, e aproveitam para “choramingar nos pés dos brancos corruptos para que apoiem seus projetinhos sociais em nome dos oprimidos”. Esses Capitães do Mato hoje são governistas e partidários da “rede branquinha” de alcaguetes chamada Ala Jovem ESQUERDISTA. ( que sonham um dia vir a ser “os coletivos venezuelanos, que o bruto Hugo Chaves criou, para balear seus opositores nas manifestações anti governamentais) Uma espécie de “Cavaleiros Templários” de classe media que compõem a armada intelectual de conteúdo ideológico-contraditório. Dizem ser Pro-Le-Tá-Rios: São racistas filhos de “riquinhos emergentes” e bem partidários de um sistema “ultra- corrupto”, de uma nova era mais ou menos organizada, que ao longo dos 12 anos criaram as milhares de ONGs CORRUPTAS
Carlos Lamarca era Maoista por convicção, por isso não acreditava no futuro da esquerda brasileira. Ele não gostava do chefe da ALN e do PCB Carlos Marighela, pela maneira que o líder revolucionário manejava as situações.
Da sua reagrupação aos dias de hoje, a ESQUERDA brasileira deixou de existir para a maioria inteligente desse país. Defender corrupto e favorecer o abastado. Isso era coisa só da DIREITA contundentemente combatido pelo discurso da ESQUERDA, e foi fundamentado nesses princípios que muito cedo me tornei um ESQUERDISTA. Manter as margens do processo político-social; negros, mulheres negras, índios e idosos, “é traição ao povo” e é isso que vemos hoje no Brasil. Um sistema de governo aliado da elite, que a favorece. Do outro lado mantém as classes proletariado nos guetos sob a mira das metralhadoras dos militares de hoje muito mais equipadas do que nos tempos da repressão militar dos anos 60 e 70, que aniquilaram o PCB, ALN, MR-8 e a VAR Palmares. Tudo isso confirma de que esse é um governo genuinamente de elite. Porque os negros querem se candidatar a deputado? “Existem NEGROS e negros”. Eu sou NEGRO. Porque os “negros
letrados” em lugar de aliar-se aos NEGROS buscando uma cadeira para, “para sentar ao lado do branco”, como os que já estão la. Porque não unir-se aos NEGROS por uma união NEGRA?